8 de fevereiro de 2019

Respondendo à questão "o que é metafísica?"

Metafísica é voo imaginativo, é brincadeira de criança, ela não vai, ou pelo menos não deveria ir, além da diversão especulativa, do prazer em se criar conjeturas. Por haver essa infantilidade, ela possui a efêmera arrogância de se achar corretíssima, perfectível dentro de um sistema; porém, um exame mais atento e minucioso logo constata a sua vacuidade, a sua característica fantasmagórica. Afinal de contas, é preciso invocar alguns pressupostos para o sistema metafísico x fazer sentido, para ser coerente.

A metafísica é a suposta causa formal de todas as coisas, contudo podemos tratá-la como mera causa de conceitos, o que é bem diferente. Por um lado ela possui uma abrangência ilimitada e contém em seu escopo conceitual o mundo inteiro, por outro lado ela é destituída de conteúdo e não é capaz de sustentar sequer uma viga nem de erguer um prego nem de segurar uma palha; podemos então concluir que seu resultado será sempre ou fantasioso ou uma aporia. A menos que se acredite que o mundo é de fato vazio de conteúdo, a metafísica serve apenas de alegoria para o nosso pensamento, o qual tem a tola mania de não se contentar com a banalidade do mundo empírico, o único com real efetividade. Ao retirar esse aspecto claramente teórico, podemos perceber p significado prático da metafísica: servir de estrutura a algum pensamento que não aceita ser reduzido ao mundo empírico. É por isso que filósofos empiristas são tão fáceis de entender, enquanto os racionalistas são tão complicados, estes "viajam na maionese".

Aspirar por algo mais que a imediatez das sensações não é proibido nem delirante, contudo não passa de renitente idiossincradia de sonhador imerso num mundo pouco empolgante. Creio que o homem é um animal imaginativo e que poucos de nós reconhecem que suas ideias não passam de ilusão. Essa insistência ubíqua em grandiosos voos especulativos e essa teimosia em não admitir sua frágil existência e condição terrena o legitimam a querer algo mais para seu ser, como se , ao não conquistar o acesso ao sublime/divino , a vida não valesse a pena. Ela vale, só precisamos descobrir como valorizá-la prescindindo da metafísica. Arte, ética e existencialismo podem ser de grande serventia nessa empreitada.

30 de novembro de 2018

Uma compilação prolixa e despropositada


Imbatível 
O que você quer ser quando morrer?
Conjetura que um dia vai crescer
Mas o grande feito da sua vida
Foi o simples fato de ter nascido
Existência resumida ao umbigo
Nem sequer faz da derrota sua amiga.

Pensa que é sujeito imbatível
Bate a cabeça de porta em porta
Pouca coisa escapa da insolência
Insolúvel tolice contumaz.
Julga ser Hulk o incrível
Nem os fracassos você suporta
Até o pedinte o vê e dispensa
Teima, tenta, nunca se apraz.

Se crescer , considere isso vitória
Suas obras soam como anedotas,
Para nós será sempre vanglória ,
Vindas de um fanfarrão idiota.
Repete e relata a mesma estória
Que tanto nos farta, consome e esgota
Basta! Extinga de nós essa memória.
- - -
Já houve silêncio 
O IBGE divulga atual Censo
Notícias me deixam intenso
Passo os dedos nos dados e penso:
Se a chuva cai sob este céu tenso
E antes de existir a voz havia silêncio,
Logo evolução é um salto em suspenso
- - -
Antes de morrer
Ao saber que irei morrer muito em breve
decido cuidar dos últimos dias,
dos meus e dos que adoro mais que tudo,
pra que de mim se lembrem e sorriam.

Eu bem poderia chutar o balde ,
ligar o foda-se, virar do mal,
pois me encontro em estágio terminal ,
só que este fogo infernal em mim não arde.

Escolho o caminho do plantio,
cuido do terreno que me cerca
Eu sei que não verei o verde ou frutos ,
pensarão em mim como o que alicerça .

Não gasto o tempo que escorre com lágrimas
Há tanto a se fazer com o que resta
E poupo os meus queridos da moléstia
Desejo legar-lhes minha obra-prima. 
- - -
O que me cabe
Esta noite até parece que a lua ri pra mim
É como se me dissesse: ela não está afim
A derrota me persegue aonde quer que eu vá
A conquista é devaneio durante meu jantar.

Não importa não, o que se escreva ou diga
Só terei uma parte daquilo que me cabe
Idílico portal para mim nunca se abre
O meu companheiro é um frasco de pinga.

Vidrado ou inerte, nada muda no final
O que anseio muito, ficará para depois
Já estou acostumado a sempre me dar mal
Passado o lampejo, volta o feijão com arroz.

Devo desistir ou devo persistir?
Perguntas vãs martelam em meu peito
Ao redor ninguém se aflige a meu lamento
Adéquo-me, neste neutro leito.
- - -
Um tal misantropo
Uma típica mise-en-scène misantrópica
Nada que a sociedade proíba
Nada que um coração não aprove
É mais algo um tanto deselegante
É mais o de sempre aos dezenove

Cair tonto e abraçar um hidrante
Ou ignorar os ignorantes
Conversar todo dia com mortos
Só olhar nas pessoas seus corpos
Ativar o morto-vivo modo

Para quê fazer o bem?
Nunca é esse recompensado
Posso até fazer o mal
Desde que ele não seja revelado
É assim a vida de João-ninguém
- - -
O cume não é nada
Parto para o cume
O objetivo está claro em minha mente
Eu me julgo imune
Tô vidrado, imprevistos passam rente.

Vejo-me verdugo
Desdenho o valioso e o importante.
No trajeto bugo
Regresso a conceitos de tolo infante.

"Insista e descubra"
Diz a voz que mora dentro da gente
"Nunca aspire a Cuba"
Agora sei o que é uma ilusão somente.

Em pausas lucubro
Sobre o que gozarei dali em diante
E elevo ao cubo
meus talentos - Serei um novo Dante?

Foi isto o que me coube:
Espalhar pelo chão obsessões aos montes
Eis que o mundo me ouve -
Percebo uma alegria em cada fronte.
- - -
Daqui para o sempre
Eu penso, logo exilo
Em um pessoal paraíso
E deixo rastejar um coração
Incapaz de se erguer do chão

E alto grito: aleluia!
Quebro assim uma antiga jura
De não falar em esplendor -
É tempo de me recompor

É daqui para o sempre
E que nunca meu amor se lembre
De quem nunca se arriscou ,
Como tanto eu fiz sob amargor.
- - -
Aversão
Eu tento ser simpático
Retiro do rosto as marcas de expressão
Removo o ódio do coração
Mas ela sempre volta.

Eu tento entrar nas rodas
É um esforço discutir papo furado
Logo transpareço enfado
De súbito ela volta.

Parceira de longa data
Quando surge à frente idiotas
Coisa tão comum de se ver
Ela prontamente ataca.

Parceira, vamos juntos
Traz consigo o sarcasmo e a ironia
Formaremos sinistra companhia.
Brindemos, aversão!
- - -
Geração Nutella
Nossa geração Nutella
Dondoca que se acha fera
Fracassado que se exaspera
A nossa geração Nutella

A impaciência virou virtude
Tudo é motivo pra se reclamar
"Nada está bom" é comum queixume
Caiu um botão, vem logo apelar

Só na granola e Ovo Maltine
Não sabe de nada o sabichão
Se vê tênis novo na vitrine
Tem que comprá-lo, ou faz climão

Se faltou Danone ela se rebela
Se faltou creminho se descabela
Se faltou cerva o obsceno impera
É a nossa geração Nutella

Fica obcecada pela modinha em voga
Sente-se na obrigação de ostentação
Engabela a vítima, então a joga em cela
E se houver um erro haverá um enterro

Nossa geração Nutella
Dondoca que se acha fera
Fracassado que se exaspera
Pífia geração Nutella
- - -
Ela só me ferra
Ah, essa garota só me ferra
Eu cavei, ela cavou, nós cavamos
Mas tudo o que retiramos foi terra –
Depois não entende por que reclamo...

Tolice procurar por tesouros
Eu devia ignorar superstições,
Agora a minha sina agouro
E clamo por intromissões.

Sempre uma alegria juvenil
Do tipo “não tô nem aí” no rosto
Com meu edifício ela ruiu,
Fiquei com os destroços e o desgosto.

Pensar que havia em nós futuro
Pensar que não havia nela ardis
Pensar que era frágil o muro,
Ao menos ilusões perdi.
- - -
Picote (Paródia)
Eu quero é picotar
Picota até o couro
Me ensina a picotar
Do crânio até o ovo

Eu vou me lambuzar
Com o sangue do corno
Cotoco que sobrar
Eu dou para o corvo

Vem cá , te quero do meu lado
Coloca esse cutelo pra cantar
Vem aqui, te quero do meu lado
Esse defunto nós vamos retalhar
Vem cá , te quero do meu lado
Esse picote vai alucinar

Eu quero é picotar
Picota até o couro
Me ensina a picotar
Do crânio até o ovo
Eu vou me lambuzar
Com o sangue do corno
Cotoco que sobrar
Eu dou para o corvo

Como eu gosto assim
Tão perto de mim
Este velho rim
Como eu gosto assim
Tão perto de mim
Este velho rim
- - -
Ciclo da vida
A vida se engendra é na escuridão
A semente eclode em momento oportuno
Até onde ninguém podia ver sob o chão
Pensava-se no mistério do Uno.

No ventre materno ou no de Gaia
Há belos processos, fantásticos
Que a mãe a seu seio os filhos atraia
Mesmo os que se perderam no Ártico .

Morte é somente o fim de um ciclo
A Natureza assimila toda matéria
E não faz isso por tola pilhéria
Mas é como ela retoma seu brilho.

A irreversível entropia do núcleo vital
Dissipa inúmeros fragmentos por Terra,
Por ela o sangue sorvido é um sinal
De que o ciclo da vida nunca se encerra.
- - -
Inferno
Dizem que o capeta usa capa preta
Chamam o anjo Gabriel contra o lorde Azazel
Dizem que é senhor das trevas o sete-peles
Mas não há em seu nome um mísero alqueire.

Por falar em nome, preferem codinomes:
Maligno, tinhoso, coisa ruim
Pra não personificar seu inimigo
Como se isso fosse algum abrigo...

Eu falo na cara, o papo é reto e cru
Estes são alguns dos nomes do diabo:
Satanás, Lúcifer e Belzebu.
Pronto, e não houve descalabros

O demônio parece mesmo obscuro
Dentro de seus labirintos me aventuro,
Pois tenho um cão do inferno sem igual
Contra ele nenhum há de ser rival!
- - -
Tô Nem Aí (paródia)
De mãos atadas, de pés descalços
Você deixava vítimas de pernas pro ar
Sempre armado, ligeiros passos
Arrancava braços pra ninguém te dedurar

Ninguém lembra seu nome
Pancadas na cabeca faz neguinho apagar
Arrancou seis dedos, cansou daquilo , partiu em viagem
Agora busca outra

Tô nem aí, tô nem aí
Pode matar o seu vizinho eu não tô nem aí
Tô nem aí, tô nem aí
Pode ficar com sua algema que eu já vou sair

Boca fechada, com três cadarços
Raptou dez menininhas e até um bom rapaz
A sete palmos, foi para o espaço
Nosso vizinho enterrado agora descansa em paz

Ninguém lembra seu nome
Pancadas na cabeca faz neguinho apagar
Arrancou seis dedos, cansou daquilo , partiu em viagem
Agora busca outra

Tô nem aí, tô nem aí
Pode matar o seu vizinho eu não tô nem aí
Tô nem aí, tô nem aí
Pode ficar com sua algema que eu já vou sair
- - -
Só a revolução (Hino)
Eu só peço a revolução
E eles vêm com resolução

São os comportados reaças
Com brincadeirinhas sem graça
Vamos à guerra, é meu apelo
Façamos história a contrapelo

Eu só peço a revolução
E eles vêm com resolução

Pela causa não existe crime
Matar ou morrer nos redime
Há um grande plano, um intento
A quem não concordou eu lamento

Eu só peço a revolução
E eles vêm com resolução

Deixem-me chamar os companheiros
Que cheiram pó ali no banheiro
Todos experts em arapuca
Afinal, são uns filhos de putas

É pedir muito a revolução?
É que não creio na evolução 
- - -
Quase Canibalismo 
Condeno o consumo de algumas carnes
Se eu alego: é quase canibalismo,
Dizem não haver problema em comer gente!
Não há réplica para tamanho acinte.

Podemos viver sem matar mamíferos
Já houve tempo em que isto não era possível :
Ficar sem bife, costela ou hambúrguer;
A fase passou, só que o fato ignoram...

Por não ser cristão, é todo ser meu irmão
Que mama quando filhote indefeso.
Não é por pecado ou por violar almas,
Mas por julgar violência gratuita.

Precisamos de proteína, admito
Porém, não devo ser cruento a quem
Não aprendeu a somar ou vestir calças -
O abatido lega a sua aflição.

Se maior espécie nos dominar
Minha coerência e fala sagaz
Pode imp'di-la de consumir o corpo
Que por anos cuidei e transportei.
- - -
Meu rompante 
O ostensivo som a meu redor
Faz atormentar mentes sem dó
Exceto a dama de batom black,
Assim que a vi fiquei de pileque

Inebriado com o contraste
De sua pele alva, boca negra -
É semelhante à pin-up do pôster -
Meu coração se sobrecarrega

A coruja em seu ombro vigia
Indiscretos olhares cortantes ,
Esse delírio foi meu rompante

Ela some, bem como a alegria ,
Voltarei a beber o fel de antes
Com lembranças da bela passante .
- - -
Contraste 
A dama da pele alva e cabeleira rubra
Incita-me para que descubra
As suas intenções e inscrições
Mas permissão para decifrá-las
Eu não possuo, então perco a fala.

Clara como neve sob a lua
Fria feito mármore ao relento
Se não fosse o calor de suas tranças,
Contraste em uma evidente dança,
Seria gelo solto pelo vento.

Seu suor é a pele que derrete
Pelo calor que emana dos fios ,
Queimando-a de cima pra baixo
E iluminando feito amplo facho -
Me traz à mente um jardim, de lírios.
- - -
Uma companheira ordinária 
Se a natureza humana é boa ou ruim?
Coisa que não sei responder , ow meu chapa .
O homem não vem acompanhado de mapas
Eu sei é dos danos causados em mim.

Sem mestres, sem apoio, sem abraços
Preciso de algo, pois então, o que eu faço?
Descubro a companheira de uma vida
A cara mas ordinária bebida.

Uns tendem a beber para celebrar
Já outros, pra esquecer uns desprazeres
Da minha parte, é para ter um par
Com quem dividir uns vários dizeres .

Poucos sabem o que é solidão
Minha amiga conhece-a bem
Até que me encontrou , Zé Ninguém
Desde então ouve diário sermão.
- - -
De beber e bebês 
Desconfie sempre de gente abstêmia ,
Incapaz de xingar, proferir as blasfêmias ;
É saudável só quem diariamente
Libera os fantasmas do inconsciente.

É verdade, álcool mata e invalida ,
Mas também gera amizades e vida;
Para cada cachaceiro pé inchado
Há três bebês recebendo cuidados.
- - -
Vida em comum?
Uns defendem Vida em Comum
Só que este mundo, Mister Magnum ,
É um lugar insólito e hostil
Nele a esperança se extinguiu.

Difícil dizer o que houve primeiro:
O resoluto isolamento
Ou desconfiança de bandoleiro.
Apenas sei que desoriento

Quando não há viv'alma a quem
Se abrir, entregar , dedicar e inflectir
Fica a vida em comum sempre aquém
Dos sentimentos que outrora orientaram
As pessoas a se unirem e amarem -
Restou este mundo aquecido e gélido .
- - -
Coisa ruim 
A minha voz não se fez ouvir
Nem sequer a três metros daqui
Já que não adianta gritar
Notei que o negócio é surrar

Nesse ramo é preciso talento
Nem todos são capazes de dar
Um tiro com o carro a duzentos
E depois tirar sarro no bar

Nem parece que sou coisa ruim
Da família Damásio eu vim
Toda hora é hora de intriga
Pois carrego o rei na barriga

Vai, vai
Vai, seu merda
Vai, quero ver me aparecer aqui
Quando eu fizer o seu dente cair

Miro o meu shape no espelho
Ajeito esta gola com esmero
Dou um teco , bate-me forte
Comigo então ninguém pode

Quebro a cara do otário no taco
Furo um olho com chave de roda
Deixo o recinto espalhando mil cacos
E chutando o que mais incomoda

Nem pareço que sou tão ruim
Até a vizinha gostava de mim
Eu é que não fujo de brigas
Execro o carrasco que me fustiga

Vou, vou
Vou, sou merda
Nunca mais apareci por ali
Desde que eles me fizeram ruir
- - -
Plantar pra colher 
Se não cultivados, ainda que em ritmo lento,
o gênio mais nobre assim como o solo mais fértil,
não podendo contar com bons ventos,
fazem emanar as ervas daninhas ,
vícios e demais bichos pestilentos
E o que era pra ser afortunada colheita
dos frutos mais ternos e suculentos
se torna uma agourenta colheita
com os frutos mais podres e macilentos.
- - -
Em um dos três dias 
Por três dias vivi na cabana sob o céu azul
Com as mãos pra cima agradecia às graças enviadas
Nós colhíamos languidamente (eu, meu ser e o nada)
Abóbora, manga, cenoura, jaca, pequi e caju.

Precisei só de um daqueles três dias para saber:
A solidão é falsa amiga, vai nos deixar à mercê
Na hora mais sombria ela se torna alma do pesadume ,
Sem ter com quer dividir, o espaço torna-se um negrume.
- - -
Miquinho amestrado 
Não quero ser um miquinho amestrado
Como as outras pessoas que se depararam contigo
Não quero ser outro touro castrado
Como o teu ex-marido vivendo de castigo

Sei que você guardaria rancor
Passando seus dias a planejar vinganças
Pois não aceita que acaba todo amor
Eu é que não quero ser o par dessa dança

Quero que fique a meu lado uma amiga
Teu temperamento só produz confusões
Quando rompes, tu viras inimiga
Me conforta que nem sequer alimentei ilusões

Eu não serei teu miquinho amestrado
Eu não serei um bichinho adestrado
Eu não serei um saco de pancadas
Eu não serei algo menos que nada!
- - -

Nossa morte 
Minha cabeça está cheia
Ela a chacoalha bem forte
Nos destroços fogo me ateia
E jura não querer minha morte

Sabe que todos têm problemas
Mas os dela é que são emblema
Dos conflitos a dois -
A nossa vida se decompôs

Ninguém mais ganhará no grito ,
É o fim do coração aflito
E o começo da melancolia
Que lá de longe ela me sorria .

Enquanto aguardo me enterrarem
Penso que poderia ter feito
Coisas que amantes bem sabem
Mas não quis eu ser perfeito .
- - -
Insociável 
Não teve o efeito esperado
Praticar a sinceridade
Era para ser virtude
Mas quem não possui qualidades
Só poderá ver meu mundo
Através de muros e grades.

Quem nasceu pra ser solitário
Precisa de fases sozinho,
À parte a popularidade
Sigo no modesto caminho,
O preço de ser implacável :
Terei de ser insociável.
- - -
De unha sujaPasso dias a resolver problemas
E mesmo assim, ninguém de mim tem pena
Pensam que fico a coçar o meu saco
Em leituras e textos eu empaco

Dormir horas a fio é luxo
Se o lençol não me cobre à noite
Sem forças, eu nem mais o puxo
Despertar às quatro é meu açoite

A memória ficou na esquina
A dieta é comer só Trakinas
A viola inerte enferruja
Agora que vi, eu tô de unha suja

"Mas essa fase logo vai passar
Aguente o sacode da Bandeirante"
Não posso correr sequer para o bar
Não tenho mais o tempo que tinha antes 
- - -
Lar de japonês 
Em cada lar de japonês
Reverência é costumeiro ,
Só não diga que você fez
Entrar com o pé sujo inteiro!

Vai sair de lá a vassouradas
Eu sempre apoio os atos justos
Esse chumbo trocado é trunfo
Pra casa não ser desonrada.

O anfitrião deve tratar
Sua visita como um rei ,
Como tal se deve portar;
Desse costume eu bem que avisei .

Quem nunca liga para símbolos
Pula o enredo e logo lê epílogo.
- - -
Lar amargo lar 
Lar amargo lar
Velhas brigas de bar
Na parede as medalhas
No pescoço a navalha
Entre o bebê a chorar
O marido a agredir
A esposa a xingar
E um castiçal a brandir

Lar amargo lar
Com a vovó que só ora
As goteiras que molham
Tudo ausente de glórias
A família Goulard
Das inoportunas falas
Que não assume suas falhas
Justo agora se cala

Lar amargo lar
Onde o gás eu entrego
De fachada é seu credo
No caixão pus um prego
Vai à lama chafurdar
Não faltaram indícios :
Do desastre implícito
Ao notório suplício. 
- - -

Parabólica 
Memórias da infância :
No quintal a antena
Imensa parabólica
O vizinho, coitado -
Ceninha diabólica

Não podia brincar,
Sem vez o pique-esconde
E nem o pega-pega
Plantas, mas nem pensar!
Pois o sinal vem de onde?

Será que o vizinho
Foi num sítio viver
Por apego à antena
Maldita e querida?
Me lembro e dá pena. 
- - -
Minha família 
Minha mãe está maluca
Raspou o cabelo pra botar uma peruca
Minha avó fora uma puta
Batia ponto toda noite na Tijuca

Meu tio chama-se Juca
Mexeu com a filha dele o cara surta
Minha irmã virou a biruta
Meteu na telha que só pode comer fruta

Família da gruta
Abençoada pela Cuca
Família astuta
Enxerga o mundo pela nuca

A nossa fera é a Tuca
Um pitbull, mas quem falou que é bruta?
Meu papai é meu truta
Já armamos juntos uma grande arapuca

Família da gruta
Abençoada pela Cuca
Família astuta
Enxerga o mundo pela nuca
- - -
Danifique o seu ídolo 
Viole
Destrinche
Assole
Profane
Aquele que você considerou intocável

Totem
Censura
Dogmas
Tabus
Tudo o que for manejar proibido

A pureza é invenção dos medrosos
A autoridade um dia decai
Enfrentá-la, só os mais corajosos
É hora de sair do colo do pai

Deprede o templo obsoleto
Despreze os seus frouxos lamentos
Danifique o seu ídolo
Dispondo ígneos intentos

Usurpe
Deite
Derrube
Arrebente
Aquilo que considere inviolável

Aja ilegal
Seja imoral
Contrariando
Ironizando
O que não pode tocar, pois interdito

Pureza, invenção de medroso
Autoridade irá decair
Enfrente-a como um corajoso
Papai não está mais aqui

Deprede o templo obsoleto
Despreze seus frouxos lamentos
Danifique o seu ídolo
Dispondo intentos ígneos
- - -
Pulha disperso
Tem que ler o que consta na bula
E tem que ter bala na agulha
Tem que ouvir o que o juiz apura
Pois senão você não passa de um pulha

E se você só pensa em sucesso
Mas não sabe pra que serve o congresso
Aí é quando suplicante lhe peço
Continue bem longe e disperso
- - -
Indômitos 
Invoco os poderes profanos
Da música, do sexo, do amor -
os heróis de um moderno
Licenciosidades romanescas
Que podem libertar da dor
infelizes aprisionados
Pelo vazio da monotonia
e pelos relógios ritmados

Esse cotidiano prosaico
que insiste em ser maior
Que o poder das fantasias
de almas outrora poéticas
Mas que o excesso de pancadas
da maquinaria ruidosa
Tornara derrotadas
e com a aura tão tétrica

Gritemos por nossa autonomia
e vários atos heréticos
com má fama de perigosos
Capaz de elevar aqueles
que não se deixam rotular
muito menos se oprimir
Pelos que julgam-se mitos
como o semideus Aquiles

Inflemos o peito de ar
E com o canto da juriti
Sarcasmo das convenções
Nos faremos indômitos
- - -
Naturezas 
Pensar além : transcendência
Pensar aquém: imanência
Tem dias para lá
e dias para cá;
São duas as naturezas
Minha moral as sopesa
e conclui: devo cair
feito passista em Sapucaí.

Pecado original
coisa do vulgo banal
Sou uma parte homem
e a outra é bicho
Esta os bichos comem
e aquela são caprichos;
Se me censura a Igreja
eu já me apronto à peleja.

Penso, condenso, dispenso
 cosmos, valores, morais
Esqueço, adormeço, esmoreço
 luz, vida, amores, metais...
Relembro que sou este nada
 o ser que tanto me convém
Eu subo e fica tudo bem,
 devo jogar fora essa escada. 
- - -
Tempo inútil 
Os ignorantes alertam "isso é perca de tempo "
Arrogantes ironizam "vida mansa, tá com tempo"
Os fiscais só  lamentam "o seu tempo acabou"
E apressados repetem "vamos, tempo é dinheiro"

Ei, me deixa só
Só para respirar
É meu passatempo
O tempo contemplar

Apenas quem experencia vai dizer
"Não foi nem será tempo perdido"
Então dos vigias não estará à mercê

A sociedade tem rótulos para o útil
Mas o indivíduo sabe o que lhe é profícuo
E manda às favas quem o chama de inútil
- - -
Sem rodeios 
Ouvi dizerem os incrédulos :
"A esperança é mau sentimento,
faz homens crerem no triunfo "
Como se ela fosse um tormento.

Só pode lutar quem espera
que cessem por ora as lamúrias
e amanhã prosperem afãs
Em troca disso faz-se jura.

Covarde, o amigo da razão
 jamais se entrega a devaneios,
pois lucidez é seu orgulho -
Mas que frouxidão sem rodeios!
- - -
Institucionalização
O marginal,
o ponto fora da curva
Corrói o sistema
feito ácida chuva.

Esse caótico
o poder adestra,
Planificadamente
toda a gente faz festa.

Os asnos bradam :
conservação!
Mas desses valores
deve haver inversão.

A mão pesada
do Dino estatal
Cairá sobre nós,
ai de quem não for um igual.
- - -
Ciclos 
Vejo folhas de décadas atrás
A data impressa não permite enganos
Ali o que eu vivi não me arrependi,
São os ciclos da vida se fechando.

Certas destrezas ficaram pra trás
Não é nada que acabe com meu sono
Aqui, dentro de mim, digo: aprendi
Já posso rir vendo meu sol se pondo. 

11 de maio de 2017

Somente um respiro de quem está em coma

Uma dica de livro

Polêmico livro, um ótimo apanhado geral da história recente dos EUA. "A história não contada dos Estados Unidos" - Oliver Stone & Peter Kuznick. Faro editorial, 2015.
Tem um documentário também. http://www.dailymotion.com/video/xzzic6_a-historia-nao-contada-dos-eua-1_shortfilms
O texto ajuda a entender melhor o nojento modus operandi dos governos americanos, geralmente apostando no medo e na vaidade da população . Da grande depressão ao fim da Guerra Fria - faço o recorte num período de 60 anos - houve presidentes q não valeram um pequi roído . Foi um pior q o outro, um mais desgraçadamente cretino q o outro, com exceção de Roosevelt (junto com Lincoln foram os maiores daquele país ) e Kennedy (assassinado por uma conspiração conservadora e bélica ). Eles ou eram porcos canalhas ou então cediam à pressão de conservadores durões e moleques q exigiam a violência.
Fica mais fácil entender a paranoia e babaquice do americano médio e o porquê desse povo ser capaz de eleger malucos e inconsequentes como Trump, Nixon e Reagan e por outro lado pedir a cabeça de um presidente por conta de um boquete. Fico sem saber se é bom ou ruim estar convencido de q Donald Trump não será o pior presidente da história, já q a concorrência é árdua , a menos q ele dispare aleatoriamente bombas nucleares do arsenal apocalíptico q os americanos contêm.
Os EUA são esse colosso, esse império q fez decretar o fim da história, q se declarou a polícia do mundo e q costuma agir com ou sem aliados, com ou sem transparência, com ou sem razão . Agora eles deslizam combatendo as pragas q seu próprio sistema nefasto acabou por gerar , após seguidas políticas e estratégias da beira do abismo, além do compreensível antiamericanismo pelo resto do mundo. Só resta torcer para q o Império não saia por aí tocando o terror,  como já o fez na América Latina , no Oriente médio e na Ásia décadas atrás. A reação à decadência já começou , ao elegerem alguém q explicitamente prometeu combater a 'moleza' do governo anterior.  Agora q o poder/influência americano está sendo gradualmente engolido pela globalização  - com exceção do seu gigantesco poderio militar, é óbvio - não é tolice temer desvarios e agressões gratuitas. O princípio da escravidão ainda paira sobre a mentes daquele povo: liberdade aos livres, opressão aos inferiores.

"What?! The "land of the free?"
Whoever told you that is your enemy!
All of which are american dreams..."

18 de março de 2017

Três textos desconexos

I

Metafísica é brincadeira de criança . Ela não vai e nem pode ir além da diversão especulativa. Por ser infantil, possui a arrogância de se achar corretíssima, só que um exame minucioso rapidamente constata sua vacuidade e efemeridade . 
A metafísica tem abrangência ilimitada,  pois não possui conteúdo e ainda assim é capaz de conter em si mesma o mundo inteiro; por outro lado, como não é capaz de sustentar nem segurar uma agulha sequer, seu resultado é sempre ou fantasioso ou mera aporia. A menos que se creia que o mundo não possua conteúdo , a utilidade da metafísica é de servir de alegoria para nossos pensamentos, que têm a mania de não se contentar com a banalidade do mundo empírico, o único com efetividade. 
Aspirar por algo além da imediatez dos sentidos e das evidências não é proibido; eu apenas penso que isso não tem como ser mais que idiossincrasias de sonhador. Eu acredito que o homem é essencialmente um animal de mente imaginativa, que conhece à medida que cria sentidos para o que percebe. Isto é , ele não admite a sua condição exclusivamente terrena e altamente limitada e imagina algo mais para si e para o mundo a sua volta. Porém, são poucos os que reconhecem que isso não passa de ilusão , de armadilhas de seu aparato cognitivo.

II

O sistema existe. Há uma (super)estrutura que subjuga as partes consideradas descartáveis. Eu não ouso chamá-lo de Teoria da Conspiração, mas de jogo de cartas marcadas em que os donos do poder sempre encontram uma maneira de manter o barco navegando, por mais rachaduras que possam haver nele – importa mais parecer do que ser funcional. E fora a balela de “quem não deve não teme”, pois se eles quiserem darão um jeito de destruir a vida do cidadão comum, pelo menos por algum momento – quem sabe nessa fase de crise a pessoa se mate, para alegria dos porcos.

Às vezes chega a parecer que as peças dessa engrenagem se revezam e que quem estava por baixo troca de lugar com quem estava por cima, só que isso ou faz parte do show ou é mera ilusão de ótica. O corporativismo não dá trégua, está sempre alerta contra maçãs podres e seres hostis. Ninguém quer largar o osso; ocasionalmente os vira-latas recebem migalhas e então ficam se achando cães de exposição – num mundo competitivo e ganancioso ou se é vaidoso ou se é deprimido. A maluquice consiste na irresistibilidade do jogo; por mais absurdas que sejam suas regras ou sua condução, poucos são os que conseguem ficar de fora.

Em qualquer lugar onde há poder, há maracutaia, manobras escusas. Essa verdade amarga tende a afugentar idealistas e bem-intencionados, o que favorece o status quo, uma vez que o caminho fica livre para que os mais espertos desfilem e passem a perna por debaixo dos panos. A boa política é lutar pelo mal menor. Quem não está perto do cetro, do trono ou da coroa, vive aguardando pela hora de se dar mal, e ainda assim é preciso defender o correto e justo. Se não, iremos simplesmente nos resignar com um mundo cada vez mais canalha, o que seria desastroso e lamentável. Parabéns aos que reconhecem esse cenário, deixaram de sonhar e de se motivar e, apesar de tudo, não se entregam. A sociedade é injusta, nem por isso a ignomínia deve ser a norma. A situação atual pode ser ruim, mas a anterior não era melhor.

III

Quem possui um espírito desbravador treinado prefere as rotas com obstáculos e terreno acidentado, pois sem o prazer de abrir estradas não haveria sentido em continuar seguindo em frente. Como um lenhador cortando a madeira que irá aquecer sua noite e sua morada, essa pessoa caminha por entre as sombras do desconhecido atrás do que quer que acrescente e molde a sua existência, dispensando convicções e demais muletas.  Repetir, variar o tema, girar a cabeça em busca de outra perspectiva , tatear para conferir a tessitura, arrancar raízes; enfim , tudo que parece inócuo mas que é bastante representativo quando se é autêntico. Atravessar sendas e veredas é descobrir o sertão dentro e fora de si para então superá-lo, no caso dos bravos, tenazes e perspicazes; ou se afundar de vez no deserto, no caso dos acomodados, broncos e desistentes. O absoluto pode até ser a meta, mas o mistério jamais será totalmente revelado; quem não se angustia com esse fato poderá expressar um sereno sorriso.

Os caminhos de floresta estão abertos a todos, mas como o seu traçado é labiríntico, podendo levar a lugar nenhum, muitos ali se perdem para em breve serem devorados pelas feras da selva ou para se entregarem aos demônios interiores (sempre lentos, carentes e indolentes). As folhas e os ventos devem apagar as pegadas do andarilho para que ninguém rastreie e o acuse de algo, pois os rotuladores estão à empreita em qualquer ponto do globo. O espírito de gravidade, deveras retilíneo, é sedutor e convence ligeiro de que há só um caminho a seguir; essa estreiteza acaba dia a dia com a leveza da infância até nos tornar mórbidos e arqueados. Ir além do óbvio, não travar ante adversidades e não tremer diante dos inimigos é algo que a maioria é ensinada a fazer desde cedo, contudo o excesso de tentações e mordomias acabou por anular o espírito desbravador que havia no início.


31 de dezembro de 2016

Meu ateísmo



Ressuscito este blog só para explicar algo que deve ter ficado implícito a quem me conhece e acompanha, talvez também seja interessante a náufragos da grande rede: a razão do meu ateísmo. Filosoficamente eu sou agnóstico, e sei que este é um posicionamento mais equilibrado, contudo eu o entendo mais como hesitação ou falta de coragem de sair de cima do muro - ou do armário, para usar uma expressão mais cômica – do que como rigor de um racionalista. O agnóstico não quer se posicionar politicamente, e como eu ando bastante atento a questões políticas, acho importante assumir todas as conseqüências de se declarar ateu. Não sou entusiasta do novo ateísmo, dessa militância barulhenta que geralmente se alia ao cientificismo e despreza tudo que não seja estritamente racional; porém, reconheço suas virtudes e principalmente a sua importância no mundo de hoje, cada vez mais intolerante, fundamentalista e radical.
Feito o preâmbulo, vamos aos esclarecimentos:
Só existe este mundo, o concreto, material, empírico, natural.
Eu posso até vir a conceber outros mundos, mas eles serão conjecturas ou da minha mente (fantasias) ou das abstrações matemáticas (multiverso). Não consigo aceitar que outros mundos sejam factíveis, ou seja, eu levo tão a sério essas teorias, das mais prudentes até as mais estapafúrdias, quanto a existência da Terra-Média; eu sou capaz de levar na brincadeira, pois possuo senso de humor, ao contrário de um fanático (cientificista ou religioso).
No hipotético (e sempre improvável) cenário de existir outro(s) mundo(s), este(s) não poderá(o) ser conhecido(s) por mim (ou cientistas ortodoxos) via método empírico. Sem a possibilidade de estabelecer algum tipo (sofisticado, rústico ou remoto) de comunicação entre os dois lados pouco importaria a existência do outro lado. É como na máxima de Epicuro, aqui parafraseada: onde sou não há outro mundo, onde há outro mundo eu não sou. “Ah, mas outros planetas, sistemas solares, aglomerados e galáxias também não podem estabelecer comunicação conosco, pelo menos por enquanto, mas nem por isso eles perdem a sua importância para nós e para o Universo”, sim isso é verdade, só que a falha nesse argumento é que a luz viaja de lá para cá e daqui para lá; ora, isso é um tipo de comunicação. “Ah, mas pessoas dotadas de dons especiais garantem que recebem mensagens do além”, posso interpretar esse ‘além’ como outro mundo, mas não posso confiar no testemunho dessa pessoa, exijo outras provas, que até hoje não foram coletadas e eu acredito que jamais serão colhidas – a frase dita por elas pode até fazer sentido, mas não são verificáveis.
Agora a parte teológica. Se Deus existe neste mundo (concreto, material, empírico, natural), ele não pode ser transcendental, ele não vai além da própria Natureza, sendo assim ele deixa de fazer jus à portentosa, magnânima e imponente alcunha de ‘Deus’. Eu chamaria esse ente de elemento onipresente do Cosmos, sem poderes especiais além de estar entranhado em tudo que forma a matéria – como foi propagandeado o bóson de Higgs, descoberto recentemente com os respeitáveis e espetaculares experimentos no LHC. Eu não acho, realmente não consigo ver justiça, que essa substância onipresente deva receber louvores como o tem recebido ‘Deus’. No máximo, é digno de espanto por nós, que vivemos  dentro de algo chamado Universo e que poderia ser o Nada, no caso de não haver esse ente.
O Deus puramente transcendental, avesso ao mundo no qual eu acredito, claramente não posso aceitar – a argumentação está acima.
Assim como eu não existia antes de nascer, tornarei a não existir a partir do momento da minha morte – pode ser inclusive antes do laudo médico, mas isso já seria outro tópico (filosofias da morte). Com isso quero apenas alegar que não é fácil ser ateu, é bastante complicado, ao contrário do que ando vendo por aí, com sujeitos esclarecidos dizendo que é muito fácil ser ateu no mundo de hoje. Não é verdade, ser ateu é dureza! Não vou me delongar, pois este também seria um tópico que tomaria bastante tempo.
Em suma, eu concebo Deus ou como um mau/incorreto uso lingüístico, ou como um delírio coletivo pela forte necessidade de encontrar explicação e motivos para a origem e a (suposta, em minha opinião) ordem do mundo ou então como um ente sem poderes divinos (indigno de louvores, monumentos e sacrifícios).
Agora a parte política e existencial do ateísmo. Eu acho as religiões em geral um atraso à humanidade, ele é muito útil para os ignorantes, frágeis, fanáticos e atormentados que querem respostas para tudo; porém, para os esclarecidos, corajosos e livres de preconceitos e amarras sociais ela é nociva, serve mais para controle social por parte dos poderosos do que para qualquer outra coisa. As ideologias em geral têm essa função, por isso elas entram no mesmo lote da minha recusa e condenação; só que as ideologias religiosas, também conhecidas como doutrinas espirituais ou dogmas – toda religião é ideológica, mas nem toda ideologia é religiosa –, estas são mais comuns e estão espalhadas de tal forma que a maioria nem percebe o veneno que jaz oculto sob a aparência de bondade e de redenção. Este é o motivo de tantos ateus alertarem para o perigo das religiões, em especial as notoriamente hostis aos valores modernos e humanistas – no tumulto é preciso gritar para se fazer ouvir.
Essa visão minha não significa que eu despreze qualquer tipo de fé. A espiritualidade é algo que eu respeito muito e não vejo como uma fraqueza humana, no máximo a encaro como um embotamento do entendimento – e como o homem não é apenas busca por saberes, é fácil tolerar essa prática existencial. A espiritualidade é uma fé pessoal que exige autonomia do sujeito e uma disposição para encontrar certas respostas e propósitos a sua existência e ao mundo como um todo, respostas que não são dadas, mas formuladas pela própria pessoa. Sem se desvincular de uma religião essa prática não é possível, uma vez que as religiões fornecem a teologia, os tabus e todo o modus operandi que levam a um tipo de preguiça intelectual que eu repudio. A espiritualidade é compreendida por mim como uma forma de enfrentar o niilismo da modernidade, a ausência de sentido na vida e nas coisas, o vazio e o tédio que nos espreitam a cada desejo satisfeito. O niilismo não é algo bacana, ele é algo perigoso e que todo sujeito que se acha moderno deve tentar derrotar em sua vida, diariamente – é aqui que entra a dureza em ser ateu, o ateísmo na prática é muito complicado sem algum tipo de transcendência e fé para motivar o sujeito pensante, apenas lhe restaria o derrotismo e/ou a loucura.
Eu não possua esse tipo de fé que caracteriza um espiritualista e muito por conta disso, eu o admiro; ele conseguiu derrotar o ‘demônio’ chamado Nada. Para fugir do tenebroso abismo do niilismo eu tive de estudar bastante e refletir constantemente sobre o sentido da vida. Encontrei algumas indicações de sentido, baseando-me em certos conceitos filosóficos, certas teorias e comprovações científicas e certos estilos e obras artísticas – redenção/salvação eu não encontrei. A religião, que parece obrigatória em certos círculos sociais, sempre foi uma lacuna para mim, desde muito pequeno mesmo, e tive de preencher esse buraco com ciências, filosofias e artes (difícil dizer qual delas contribuiu com mais conteúdo).

Muita, mas muita gente faz o cominho oposto, abdica dos três saberes fundamentais para mim e acaba pautando a sua vida e seus juízos quase que exclusivamente na religião que escolheu (ou que lhe escolheu). Eu acho triste, tanto para a pessoa quanto para a nossa sociedade, e imagino esse caboclo como o trouxa da alegoria da caverna, que jura que as sombras é a coisa mais real do mundo; o interessante é que ele deve pensar quase a mesma coisa de mim.



6 de maio de 2016

Só para ninguém pensar que já morri, uma compilação

Mundo frio e sombrio

O mundo é um lugar frio e sombrio
Tão desolador pela ação humana,
Agora o sol não produz frescor
Mas isolamento e acusações.

Eis que o antigo mundo se partiu:
Ganância, plástico e temores
Romperam com uns velhos deleites –
Confiança é grande ingenuidade.

Que resta fazer no novo mundo,
Admirável enquanto distópico?
Eximir -se da culpa e apontar
O dedo, sem coragem de luta.

Nesse mundo vícios são louvados
Se escarnece de toda virtude
Importa somente consumir,
Espelhando a vida sem valor. 

Mundo tão frio e sombrio

O mundo é um lugar frio e sombrio
Meu esforço não a vale a pena
Muito menos pra essas pessoas
Todas são a meu reino ameaças.

Se ao menos o suicídio fosse opção
Pra se livrar da angústia e desilusão
Mas ele é desprezível aos saudáveis
Minha saída: ser polemista.

Não vou me vitimizar
Como um ressentido tanto adora
País afora, barraco afora
Vou lutar contra este mundo

Nem vou cultivar desertos
Tentarei agir bem certo
Ações danosas e hostis
Enquanto o mundo for sombrio. 

Minha jornada

Até o passado minha jornada:
A espera é longa, o tempo, tirano.
Pego fôlego (descida imensa)
Cruzarei o mundo mergulhando?

Os pesadelos vêm aos milhares
Viraram parceiros de viagem.
Devo sacrificar o meu orgulho?
Dizem que isso os adultos fazem.

Agora será que é muito tarde?
Não há um porto onde posso ancorar
Minhas ilusões e solitude,
No leme estou a beber e a chorar.

E por mais que eu tente ou me esforce
Não toco o fundo, só me afundo
Há um chamado que além ressoa,
Como se fosse d'outro mundo.

Sei que já não pertence a mim,
A quem tanto eu sempre quis ser
O meu passado é terra estranha,
Não sinto lá qualquer prazer.

Por não achar onde pôr a cabeça
E dormir o sono longo dos justos
É meu descanso na melancolia,
Mas nem assim a cada dia eu murcho.

Findou-se a trôpega jornada
Houve uma coisa que perdi:
A cara e tosca identidade!
Foi então que achei meu lar aqui. 

Canção da Terra

Meu planeta Terra agita e grita
Faz um grande alerta pra nação
Meu planeta Terra dança e treme
Enquanto minhas costas tocam o chão

Meu planeta Terra cospe fogo
Retira os elementos mais profundos
Meu planeta Terra está em jogo
Então vamos todos cantar juntos

Chega de fazer-me sofrer
Pois a dor retorna a vocês
Não dá!
Não dá, não dá, não dá
Ações q não têm para quê
Chega de fazer-me perder
Perdendo a integridade
Perdemos dignidade

Meu planeta Terra se levanta
E diz q nunca mais haverá janta
Meu planeta Terra está imundo
Então vamos todos cantar juntos

Chega de fazer-me sofrer
Essa dor retorna a vocês
Não dá!
Não dá, não dá, não dá
Ações sem ter um porquê
Chega de fazer-me perder
Perdendo a integridade
Perdemos dignidade 

Canção de um condenado

Pedregulho, pedregulho
Tanto eu amo o teu barulho,
És motivo de orgulho
A meu silêncio ou murmúrio.

Britadeira, britadeira
Que acaba com pasmaceira
De segunda a sexta-feira,
Nem me sinto mais abelha.

Querida bola de ferro,
Companheira do desterro
Confidente desses berros
E ajudante dos meus prélios.

Lamparina reluzente,
Que na cena quando ausente
Álcool no rabo-quente
Fez fugir este doente. 

Geração sem Mertiolate

Não queremos um instante sofrendo
Não queremos ver o bife morrendo
Cremos em um mundo que favorece
Nossos privilégios por fortes preces

Mertiolate não mais arde
E que mamãe venha repor
O ovomaltine que nos salva
Do leite amargo e sem sabor

Crescemos sem amadurecer
Se aprendemos com o prazer algo
É que em excesso ele faz você
Não saber lidar com os buracos

Agora adultos precisamos
Amar o outro, sempre Narciso
Relacionamento de escambo
Onde um diz ao outro: eu te piso!

...revolução, amém

Nada mais importa, não
Ninguém mais informa, sei
Que tudo acabará
E eu não viverei
Amém

Nada mais é grande, então
Ninguém mais comanda, o rei
Ilusão se tornará
E toda adoração
É feia

O mundo que passou foi nobre ficção
Valor que acabou, ficou a recordação
E nada mais... ninguém refaz?
Conte com seu neto
Reaprenda o alfabeto.

O que vocês pediram ali
Provocou um rombo, o fim.
Foi só revolução
Só a revolução

Vocês que quiseram assim
A custa de uns mil rins
Pela revolução
Por uma solução. 

Insolúvel

Chega, não há solução!
Há apenas convicção
De ter feito as escolhas
Que eu nunca as desacolha,
Senão é fala boçal
De quem espalha o mal. 

Papo de músico

Para aqueles que trabalham na noite
Entretendo seu respeitável público,
Como se o ouvinte fosse alguém único
E não merecesse qualquer açoite:

Nós somos músicos, não temos nada
Fora a maconha que compramos na quebrada
Nós somos músicos fora de moda
Porém tem gente que inda nos acha foda  

Tocamos música, só voz e guitarra
De vez em quando um bebum chega e escarra
Tocamos música, sempre uma porra
Gritam do fundo: espero q morram!

Obrigado por ouvirem nossas canções
Mesmo que vocês não passem de peões
É que nos acostumamos com os vizinhos
Jogando garrafas de cerveja e vinho 

30 e poucos anos

A casa dos trinta chegou pra mim
Sim, este é o princípio do fim:
Meu corpo sente os efeitos ruins
E a mente implora "sai daqui! "

Chatice pode ser questão de grau,
Pois foi de algo desse tipo que vim
Mas decadência é prova cabal –
Não suportam mais álcool meus rins.

Será que tudo o que há é do mal?
Vivo num mundo vil e sempre igual?
Chega -me o Fulano de Tal
"Larga disso, basta jogar mais sal. "

 Fico parecendo um boçal
Com meu queixume semanal,
Os meus reclames do plim-plim –
Sou o rabugento espadachim.

Acabarei cosendo roupas com dedal
Ou num Palácio com ouro e dimdim?
Um tirano Ba'al, suave feito Gal,
Doce de quindim ou um árido aipim?

O que posso eu prever, enfim?
Bom, eis o planejamento anual:
Acabar de modo bem clean
Pá de cal por sobre a urna de cristal! 

Quando resisto

Quando meu coração bate mais forte
Quando minha mente evoca n imagens
Quando meu lirismo desvela sentidos
Quando meu eu se sente mais amplo
E quando minha vontade reverbera

É quando estou vivaço, resisto
À inércia, ao destino, à morte e ao nada.
Quando eu desistir de resgatar
Estes raros e intensos momentos
Enterrem-me, com ou sem respirar. 

Imersões

Estou imerso
Numa corrente irresistível
Sou levado pelo fluxo.
 Não se apresenta crível
A minha essência

Estamos imersos
Numa cultura estéril
Que empurra seus dejetos
A sua barriga, não é sério.
Nós somos cínicos

Então emerge
Tudo o que foi varrido
Para embaixo do tapete.
Vê-se que está falido
Este sistema

E cadê o cerne?
Das questões sobre existir,
Das sessões sob o luar?
Nada mais é natural,
Nem sequer resta lutar:
Agora é imergir. 

Ao menos você

Se ao menos você soubesse o quanto
É isolado o meu recanto
Talvez não perturbaria tanto
Meu sono e esperaria amanhecer.

Se ao menos você escutasse o pranto
Que eu abafo sob este manto
Reconheceria os meus encantos
Encerrando os torpes fuzuês.

Se ao menos você me achasse um santo
Alguém que fala esperanto
Mas não sou divino por enquanto
 Eu só faço o que me cabe fazer. 

Nós entre oitavas

Com o meu olhar perdido no vazio
Do percurso existente entre seus passos
Entre esta melancolia e meu brio.

Tudo o que poderá haver entre nós
Está na distância das oitavas,
Cantemos, então, notas de dó a dó. 

Sem medo

A falta de você angustiava meu ser
apesar de você não ter rosto nem um nome,
O peso que fez a sua imagem exercer
Sobre mim quase levou-me a manicômios.

Travando uma luta contra pulsões indômitas
que puxam minha mente pra cima e pra baixo
Céus e inferno me aparecem, ambos rechaço.
A falta e a imagem suas não mais amedrontam. 

Abuso

Não há lirismo em meus versos
Não sou único, estou inserto
Toscas redes eu teço
Nelas nunca eu desperto.

Sofríveis criações
Semanalmente esboço,
Alivio feições
Pra não jogar um troço

Em cima de cabeças
Tão teimosamente ocas
De sorrisos obtusos

Que algo jamais me peça
Essa gentalha mouca,
Senão alegarei abuso. 

Perder da vida

     Algo que descobri
Após doses de gim:
     Quem não possui segredos
É alguém que não tem medo
     E que não se revela,
Então perde da vida
     Sua parte mais bela -
Dela fez inimiga. 

Pedras

O homem de pedra no banco de pedra,
Ambos ali impassíveis,
Uns transeuntes passam,
Nem precisam gritar "corra e lhe prenda"

O homem sentado, coração de pedra,
Está alçando as alturas
Só por ele imagináveis,
Enquanto o mundo banal ele nega.

O homem toma distância da pedra,
Companheira impossível,
Então parte sem rumo,
Pois sabe que jamais haverá perdas...
mas pedras. 

A beleza e o nada

A beleza perfeita existe
Mas só no mundo das ideias,
Para além dos seres concretos.
Seres ainda sem conceito
Nem quaisquer valores intrínsecos,
Pois não tocados pelo tino.

Retire do particular
O conceito mais elevado
Que tem o nome de Sublime.
É então que mudará seu mundo
Ausente de sentido e voz,
Salvando-se do grande Nada. 

A beleza salva

"A beleza salvará o mundo ",
essa idiota frase russa
custou muitos cabelos brancos
 do poeta sem intuições.

A beleza é crença do artista,
ou melhor, é seu ídolo etéreo,
ao crer nela produz ele obras
sentindo-se renovado e útil.

Quando a fé na beleza acaba,
 vai-se também a joie de vivre.
Conclui-se que a beleza salva
esvaziados descontentes
 com sua própria vacuidade.

Ciclos

Vejo folhas de décadas atrás
A data impressa não permite enganos
Ali o que eu vivi não me arrependi,
São só ciclos da vida se fechando.

Certas destrezas ficaram pra trás
Não é nada que acabe com o meu sono
Aqui dentro de mim digo que aprendi,
Já posso rir ao ver meu sol se pondo

3 de outubro de 2015

Quando a inspiração vem, só nos resta deixá-la fluir




Possibilidades

Possibilidade :
Tangibilidades e anormalidades 

Agora não sei o que eu vou ser 
Em cima da prancha, acima do mar 
Depois me decido, quando crescer 
Velho ranzinza, igual a meu pai? 
Perdeu os cabelos, só fez reclamar 

Tangibilidade:
Anormalidades e possibilidades

Embora eu não saiba o que é vencer 
Me dá a luz do sol indicativos 
Prossigo na sombra, sigo na fé 
Dou minhas pausas, de ferro não sou -
É quando refletir atrai o alívio 

Anormalidade :
Possibilidades e tangibilidades 

Deparo-me com outra encruzilhada 
A hora em que eu me sinto mais vivo -
Não é momento para piadas. 
Faço as pazes com o grave destino 
Nós prosseguimos sorrindo, e altivos!
 

Ser néctar e lava

Sendo abelha o tenaz homem
Transporta o néctar seminal
De flores sensuais, então
Poliniza, dissemina, fragmenta-se.

Dos gregos as estátuas e as peças
Do teatro, a céu aberto
Restam só os fragmentos
Há para o homem moderno alguma grande diferença?
A mudança é na grandeza,
No valor da história e na beleza.

A criação é inconsciente nas mais vezes
Não pertence ao 'eu maníaco '
Mas à soma de refluxos,
Quando x dá lugar a y,
A seguir desaparece...

Mini mudanças preenchem o Ser,
Que culminam em sua sucessão
Outra roupagem, em outro contexto,
Mas nunca deixa de ser o que se é.

Sendo por fim vulcão o homem
Tem na lava a sua essência,
Não no visível ao longe :
Cratera imensa assimétrica.


Meu sal

Não sei se a digníssima 
Vai ser do bem ou se vai ser do mal 
Apenas o que sei 
Não pode ser ela um tipo normal 

Sou capaz de esperar 
Meses para ouvir sua terna voz 
Naipe mezzosoprano 
Toda frase dela, um veludo em dó 

Será meu sal da terra 
Dará sabor a tudo q farei 
Vou ter pão, a comida 
E quando acabar vou pedir replay 

Ao receber trocados 
Todos os meus segredos vou lhe abrir 
Pedindo uma palhinha 
Da música da vida, bem-te-vi 


Olhar de granizo

Dependurado no penhasco
recebo o teu gélido olhar
Como um granizo acelerado
que me atinge, sem perdoar.

Deveria ser um crime,
auxílio ao suicídio
Desprezo que não redime...
Eu só existo agora em vídeo.


Longe

Eles vêm com explicação:
é causa-efeito, causa-efeito
Mas nem sequer chegaram perto
do meu partido coração.

Acabarei numa rotina
para manter a mente sã
Por ora, por aqui flutua
Minha alma, feita bailarina.

Para bem longe voarei
Que seja apenas fantasia
É o que exige minha moral.

Se junto dela eu viro um rei
Longe dela, já sem coroa
E sem um trono, sou anormal.


Janela da alma

A janela da alma pode 
camuflar o que há casa, 
não falo de óculos nem vendas, 
mas dos olhos de ressaca, 
que de forma irresistível 
o padecente amante enredam.

As lívidas olheiras 
sob olhos enigmáticos 
são o efeito do cansaço 
após tanto encantar, 
tragar e seduzir, 
como um forte e terno abraço.

Sempre é um risco a tentativa 
de decifrar essa esfinge 
que pune hesitantes e ousados, 
pois só pulará a janela 
quem for o mais perspicaz, 
sem acabar-se machucado.


Vulgar 

Não bajulo ídolos com dente-d'ouro 
Não me ajusto com crápulas de Armani 
E nem seduzo a oca madama infame 
Sei que ama a multidão da fama os louros -
São todos heróis de meia-tigela 
Que o vulgo, feito trator, vem, nivela. 


Despedaçado no espaço

Ele tinha uma mente brilhante
Mas seu coração deveras errante
fazia com que ele
se perdesse entre o tudo e o nada,
no infinito e sua longa estrada.

E foi assim, de ideia em ideia,
de contextualizações a pirações
Descobriu ele o ponto ideal,
seu algoritmo de sucesso:
Na incompletude do trivial.


 
Durmo na cova 

O amor se foi 
É o tal mundo burguês 
Preenchido por Góis, 
Yuppies e filisteus. 

Acordem-me da cova 
Quando for boa a moda 
De declamar as trovas 
O amante, que elos solda 
E sua bela amada louva. 


E agora, mané?

Agora, que a minha grana tá bem curta
Não consigo descolar nem uma puta
Falta até para o espaguete
Agora, que as minhas posses foram embora
Eu escuto só: vai, senta e chora
Minha mulher só quer num flat

Agora, de aparência desiludida
As roupas todas bem fedidas
Um mendigo nem me pede
É hora de acabar com a ignomínia
Vou provocar o pior tira
E me tornar mártir na rede

Agora não há mais qualquer agora
Escutou bem, minha senhora?
Agora não há mais qualquer agora
Pois a minh'alma deu o fora!


Rainha da deprê 

Ela se vê mulher demais, profunda 
Mas repete falas de tablóide 
Sempre pede: toca um Pink Floyd 
Nem sequer sabe o q é ummagumma 

Acho q devo ir, tentar a sorte 
Sair por aí atrás de uns rostos 
Pois juntos mais algumas noites 
Um de nós visitará a morte 

Eu tentarei manter-me sóbrio 
Sempre ouvindo a voz do meu mestre 
Pra não acabar num lance imóvel 
É o meu adeus, rainha da deprê


P.S.: Será este blog Jason, o renascido do inferno? Só o futuro dirá. Até lá mais uma vítima morrerá!