‘This is the end, beautiful friend
This is the end, my only friend, the end
Of our elaborate plans, the end
Of everything that stands, the end…’
"The End" - The Doors
This is the end, my only friend, the end
Of our elaborate plans, the end
Of everything that stands, the end…’
"The End" - The Doors
“O rock morreu”. Essa frase é dita há muito
tempo, desde o final dos anos 90, que eu me lembre. O grunge, o britpop e o nu
metal foram os últimos grandes momentos do rock, e ocorreram justamente em
meados dos anos 90 – por favor, poupe-me do emocore. No século XXI é notório
pra qualquer um minimamente ligado em música que o rock parou de tocar nas rádios
e na TV, parou de gerar grandes bandas e rockstars e parou de chocar após as
tetas de Marylin Manson em “The Dope Show”. Houve uma imbecilização da
indústria, com novidades sendo expressas por músicas e personalidades ridículas,
andróginas e pop, como Lady Gaga, Justin Bieber e Miley Cyrus, entre outras
aberrações que prefiro nem citar – elas lembram o glam rock, que eu detesto, por sinal. A
pergunta que todos os amantes de música boa e com atitude se fazem é: o rock
então morreu mesmo ou está apenas se convalescendo? Se morreu de fato, qual
foi o motivo? Adianto que minhas respostas são especulações de quem ouve rock
há uns 20 anos, não se trata de estudo de caso, muito menos de estudo bibliográfico.
Primeiro ponto: a tecnologia. Do
vinil para o k-7, daí para o CD, daí para o .mp3, daí para o p2p, daí para o
iPod e etc. A facilidade de acesso, comunicação e arquivamento do áudio foi uma
revolução, se antes era preciso viajar quilômetros, aguardar a música aparecer na
rádio, trocar uma ideia séria com algum sortudo que tinha a mídia, entre outras
dificuldades logísticas e de transmissão, após essa revolução ficou tudo mais fácil.
Fácil até demais. O homem tem este problema: quando recebe algo com facilidade,
de graça, ele não valoriza como quando desembolsa uma grana ou despende um
esforço árduo. Sendo assim, fica
compreensível o tédio e a indiferença com a arte dos músicos que são
encontrados em qualquer esquina pedindo um trocado e com os arquivos acessados com
um mero clique. Por outro lado, a concorrência é tão grande que poucos estão
dispostos a prestigiar o artista, alegando que podem baixar a obra num site ou
ver o vídeo no YouTube, entre outros meios gratuitos. Eu tento comprar CDs, ir a
shows e tal, porém há tanta coisa para se fazer e contemplar que fica difícil
dar dinheiro pra todo mundo – admito que sinto uma leve culpa por ajudar tão pouco
a cena, que é reduzida quando penso que não há esperanças anyway, que o individualismo prevaleceu.
Segundo ponto: os donos do poder.
Os conglomerados da comunicação em massa não estão interessados em nichos, em
qualquer tipo de programa que não atinja o grande público, eles querem ganhar
dinheiro e evitam ver a marca de seus patrocinadores manchada. O rock tem essa
pecha de música de revoltado, drogado e inconveniente. É clássico o caso de Jim
Morrison se masturbar no palco, proferir palavrões em rede nacional, apesar dos
conselhos de alterar a letra, cantar bêbado e transparecer loucura. Há exemplos
de outros artistas decadentes que agiam para impressionar o público e causar
algum desconforto para a massa idiotizada pelo status quo, mas eu gosto de lembrar só do Morrison, um dos meus
frontmen favoritos. Ou seja, o rock apela, ele diz na sua cara “é bom aprender:
a vida é cruel, você vai morrer e não vai pro céu”. Não tem essa de ser mimado
por ele, o artista com atitude rock’n’roll está cagando para o consumidor, ele não
está ali para vender mais, ele está nos holofotes para escancarar as mágoas que
a sociedade em geral esconde sob máscaras, maquiagens, embalagens lustrosas e
sorrisos fajutos. O ‘rockeiro’ não existe para lamber sua bota, sua boca ou seu
pau, ele não é colorido e manjado, ele é sombrio e autêntico, ele instiga os
inconformados e provoca os inteligentes que ainda não possuem experiência para
compreender o que é a vida pós-moderna. No
Brasil dos anos 80 havia as boys bands, as bandinhas de criança e as de festa,
mas havia o rock sério e pesado, sendo que este perdurou. Hoje, no entanto, após um hiato, restou o rock festivo e o suave, para fazer as meninas menstruarem sem dor - principalmente
após a morte (física) do Chorão e a (psicológica) do Lobão.
Terceiro ponto: há muitas válvulas
de escape. As pessoas, em especial os jovens, se compararmos a 30, 50 anos
atrás, conseguem encontrar substitutos e reduzir suas frustrações rapidamente.
O rock, como eu disse, é (ou deveria ser) sombrio, é uma excursão ao lado negro da força, com
sua superação pela expressão artística. Porém, com o excesso de meios para
extravasar essa raiva juvenil e antiburguesa, não dá tempo para acumular
energias ‘negativas’ que emocionem o sujeito como ocorria antes, quando o único
meio para agir melancólica e agressivamente na vida era por introspecção e
conversas tête-à-tête com outro sujeito que pensasse de forma semelhante. Não há
como formar um grupo (extenso) que gere um movimento coeso como ocorreu nos
anos 50, 60, 70, e até mesmo nos anos 80 e 90. Os interesses são muito variados, as distrações são muito grandes e os indivíduos estão dispersos. Além disso, o que ainda não foi dito, inventado
e experienciado? É bem mais complicado ser original. O sistema capitalista na
era da informação conseguiu absorver essa gente, unir os dados e impedir que
artistas com ideias ousadas e incisivas prevalecessem na grande mídia,
relegados ao underground. Nunca o mainstream foi tão careta.
Quarto ponto: há uma grande
nostalgia pelas bandas clássicas. Isso não abre espaço para que novos artistas
e novas concepções vinguem. O capital entendeu isso e vende os shows de ‘rock
pesado’, como Iron Maiden, Metallica e AC/DC, esquivando-se da alcunha de ser ‘contra
o rock’. Ora, esse pessoal virou marca, já deu tempo mais que suficiente para
formarem um público imenso e cativo, que paga preços exorbitantes por um
ingresso, mais os boxes de CDs, DVDs, figurinhas e bonecos. Gene Simmons foi quem
iniciou esse processo, replicado mundo afora, de atrair o fã colecionador e
gastador. Eu gostaria que esses mesmos investidores aplicassem sua grana em
bandas com menos de 5 anos de estrada e 2 discos na bagagem. Duvide-o-dó. É disso
que se trata a mídia conservadora e covarde, não estimula a cena musical
divergente, mas apenas os produtos rentáveis, ou seja, vende o pop e o mais do mesmo - é claro que isso sempre aconteceu, a mídia preferia mostrar o galã Elvis ao estranho Johnny Cash, contudo a diferença é isso estar hoje exacerbado.
Por fim, noto que hoje em dia o
mais importante é parecer bacana, sorridente e vencedor. O ‘loser’ não se
insere socialmente, então resolve se tornar ‘emo’, choramingando porque não tem
amigos e porque seu círculo não entende as suas tristezas. Ora, esse
ressentimento é e sempre foi muito comum entre os adolescentes, o que mudou é esses jovens se trancarem num quarto planejando seu corte de cabelo,
suas mensagens suicidas e seus vídeos chamativos e tristonhos. Ora, ora, pegue
uma guitarra, um microfone ou uma bateria e faça um som que expresse sua
inconformidade com o mundo ou com seus vizinhos, ou então escreva um livro com
todos esses pensamentos soturnos, infelizes e rancorosos e divulgue-o entre a galera rock – a geração Beat
(beatniks) era formada mais por escritores que por músicos (de jazz e blues) e
influenciou fortemente o nascimento do Rock. Não há mal algum nisso, é apenas
ingenuidade sua pensar que só os outros são felizes; as máscaras dominam as relações
sociais, a sua máscara é apenas a mais mal modelada, por enquanto, pois pode se
transformar, ficando bela, ainda que bizarra, desde que haja uma ação autêntica
sobre ela. A vontade deve se direcionar para fora e não para dentro, pois isso
corrói qualquer um, mas é o que tem acontecido: de tanto fingirem, as pessoas se
esqueceram de cuidarem de si mesmas, deixando o invólucro bonitinho, enquanto o
conteúdo ficou podre, carcomido por essa vontade verdadeira reprimida. O rock expressa angústias, entretanto, numa
sociedade neurótica e vigilante, ser revoltado, feio e barulhento parece
incomodar demais, fazendo crescer nesses moleques a culpa de serem excluídos por não se adequarem ao
padrão de conduta ‘normal’.
Percebo, ainda, uma ojeriza em
pertencer ao underground. É a velha questão dos modismos. “Ninguém mais escuta
rock, isso é som de velho, do tempo do seu avô”. É como pedir para um jovem ouvir
Cauby Peixoto, Nelson Gonçalves, Carmem Miranda ou Cartola. Jovem tem horror a
ser ultrapassado, ele precisa ser descolado, cool, pagar de gatão, ainda que
seja contra suas preferências estéticas e reações emocionais. Há uma primazia
pela inserção social, senão sofreria bullying, esse demônio juvenil - basta ser 'zoado' pelas imperfeições da natureza, o jovem então se esquiva de provocar mais pilhérias por seu jeito excêntrico. Apesar de
tudo, ainda existem garotos e garotas com massa encefálica em funcionamento
saudável e com obstinação para enfrentar esse trator da homogeneidade de
pensamento e do espírito de rebanho, suportando o fato de serem avulsos. O Clown do Slipknot criou uma boa
personagem para esses rejeitados do sistema: maggots. Eles são vistos como vermes pelos ‘descolados’, no entanto
não param de se reproduzir e ainda possuem alguma expressividade e beleza, ignoradas
pelo status quo. É uma pena, pois
amplia o preconceito de ambos os lados. O rock (enquanto movimento cultural)
morreu, mas seus descendentes ainda demorarão muito tempo para serem extintos. Et vive la résistance!
X
P.S.: Indicações de leitura (na realidade a 1ª é um imperativo aos que se
interessam pelo tema, já a 2ª não): “O Rock Morreu: mas a boa notícia é que ele está
embalsamado” http://whiplash.net/materias/biografias/197236-industriamusical.html#ixzz3KUMsSxSt
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