14 de junho de 2010

Labirintos e Desespero

Da escuridão à luz; através do silêncio; calar-se, não tagarelar, nem por impaciência nem por pusilanimidade; morar por um bom tempo na intemporal noite. Vagar solitariamente nos labirintos.

Superar a angústia para não girar, assim, a esmo. Após os esforços tolos, parar e aceitar a serenidade. Toda esperança é frustrante. No desespero o presente, nada mais há a perder, exceto as ilusões: força da recusa. Não mais precisar aguardar. Leveza, insustentável.

Consumismo e suas juras de satisfação, e esperamos, demais, sintomas de nosso tempo adoecido. Após a posse, queremos mais outra, e logo, afinal, tudo é para logo, cadê o logos? O jogador aposta e espera, por vezes celebra, mas na maioria se frustra, e nunca fica feliz. A esperança vicia; a ânsia por recompensas é suplício.

Medo gera superstições, que nos prendem à caverna, então esperamos ajuda externa, divina, é o fatalismo da covardia – as religiões. Logo, detêm-se. Sacerdotes prometem, são mercadores de ilusões, vendem otimismo – a fé é tolice. A morte sempre nos vence, descendo em vida, quem sabe atingiremos, no abismo, alguma verdade.
Após a fé, perder-se, desprender-se de todo laço social ou afetivo, inclusive de si. Encarar a morte, o severo barqueiro Caronte. Um escândalo, o limite, impossível apelação. Hades não pode ser enganado, ensinou-nos sua punição a Sísifo, a vida é um esforço absurdo, ao sucesso segue-se a decepção da pedra rolante. O que é vivo não pode ser imortal, só os símbolos o podem, vide os deuses.

Saber cultivar, a vida deve ser uma tempestade de nossos sonhos e desejos. A experiência de si é a mesma do desejo. Eros e Vênus nos governam. A sós inventamos sóis a nos iluminar e servir de companhia; como é difícil a lucidez do coveiro do divino! Atravessar o deserto da anti-transcendência para poder enfim ser criança, e não mais leão, muito menos camelo.
Renunciemos à salvação, e riamos, e dancemos... A vida é sem objetivo, a felicidade não é um. A condição humana é peculiar, minúscula e risível. Odiar-se é levar-se por demais a sério.

Ennui, tédio se soluciona com esquecimento, mas a consciência é o morcego que adentra à noite ao quarto... e a memória não é seletiva. O vazio é um alerta para corrermos, vivermos, não é o chamado de nossos fantasmas. Não devemos ter horror a ele, ou faremos e falaremos qualquer idiotice por não saber aproveitar a oportunidade do (talvez maior) aprendizado – a solidão.

Criatividade a partir do nada, saber ouvir o perturbador silêncio. Ao passar por isso, guarda-se, no fundo dos olhos, como os aventureiros, o sonho secreto de suas viagens. A cada um cabe a imensidão, ou não, de seu céu. E cada qual tem o deus que pode. Aceitar o contrassenso e os paradoxos; sim, desespero, navegar sempre; a terra, mesmo à vista, nunca chega. Imaginar: fazer do nada uma realidade fascinante.

Despertar e ascender. Idealizar é sofrer a queda, sabedoria é se elevar, sem ser iluminado, sem graça divina. E do chão não se passa, mas do cume também não, a menos que voemos mais sabiamente que Ícaro.

Os apaixonados amam a imagem, seu simulacro, o fax simile. Se as pessoas são tão difíceis de serem amadas, sobra a idéia para nos consolar – projeção e tolerância. E por ser uma conquista, há sensação de elevação, sem o sonho nada disso seria possível, se não houvesse mérito, como se poderia amar? Contos, moda e mídia contam mentiras sedutoras, impondo o seu belo. Refletir para moldar seu próprio belo – autenticidade e relatividade.

E Narciso pensa que se ama, mas ele não se conhece, e o que é, como posicionar, exatamente, o Eu? O Eu é um estranho, um outro, só resta ao sujeito a ilusão de si, porque a natureza é que pensa em mim. Sabedoria é renunciar à posse, alegria é amar aquilo em mim que não é eu. Conhecer-se é contentar-se.
Iceberg da mente, apenas a consciência se apresenta, 90% se esconde, e é imprescindível. Mundo quântico, só há movimento e combinações fugidias. Num momento se cria e se dispersa, perpetuamente. Somos nômades e cada um é seu próprio refúgio.

Fingimos ser alguém, é preciso acreditar em algo. Como viver ser qualquer crença e metafísica? Até uma máquina acredita, em seu programa. A maior ilusão: pensar viver sem ilusões.

Cada pessoa é uma máscara e a sociedade é esse teatro de mascarados, e cada um julga essa representação como tragédia, drama ou comédia. As máscaras protagonistas são aquelas que passam despercebidas.
Viver é desejar e desejar é viver, porém há teimosia, ninguém, até mesmo uma idéia, pode deixar de resistir à sua falência. Perseverança: afastar a destruição e a derrota. Pois somos finitos, o tempo só existe para o que não dura, e o que não para de durar? Só morre o que é vivo.

Queremos expansão, é essência humana – a potência de existir. Em sonhos e em mitos voar simboliza a excitação e a ereção, na luta contra a gravidade e a lógica. O ilimitado pelo limitado: o finito se define (ou definha) pelo infinito que não é, mas que desejaria ser. Em nossa carência negamos os limites.

A partir de quando há uma tendência, dela surgirão sentimentos opostos. Além do bem e do mal: não são os valores que definem o desejo, mas o oposto – ética e estética. Afirmação, atividade, alegria.
Ao contrário da ortodoxia religiosa, que exige submissão, ser escravo dos deuses: o bem não é feito, é seguido. O asceta, o santo, não tem personalidade e é desmemoriado. Deseja a morte para livrar-se do tão maculado corpo. Como pode ensinar a viver desse modo, se, pelo contrário, tudo parte do corpo?

+=-,/.*

Continua... (talvez)

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