É incrível a falta de iniciativa da grande maioria das
pessoas, tão lacônicas, quase que zumbizando. Talvez preocupadas demais com seu
mundinho, não ligam para o que é novo e com potencial de entusiasmar; e o
management ainda vem com seu discursinho cobrando por motivação – mas como? O
sistema instaura o comodismo. Seguimos o fluxo, deixando nossa autenticidade
escondida em algum baú recôndito de nosso coração. É tão cômodo ser rebanho,
com o pessoal detentor de autoridades, com os formadores de opinião, com os
donos do poder, ditando a nossa vida, escolhendo por nós, confortando-nos em
nossa menoridade. Como há gente acanhada que dá seus gritinhos de vez em quando
só para se sentir vivo, quando na verdade isso não passa de lapsos psíquicos ou
sintomas de alguma patologia crônica, disfarçada a ponto de nos impedir de desconfiar
da enfermidade.
O cristianismo sempre pregou, ainda que geralmente de forma
velada, a resignação como forma de preservar a alma das impurezas do mundo;
sabemos que essa moral tinha fins mais políticos, para evitar revoltas contra
seu aparelho pouco dinâmico e deveras tirânico. Pertencemos, sem dúvida, a uma
sociedade com valores cristãos, e essa aceitação passiva ao que vem de cima e à
“vida é assim mesmo” resultou nesse comodismo geral. Para mim é sintoma de
sociedade doente, quiçá anêmica. Isso é o modo décadent de agir, porém andando satisfeito com a própria
mediocridade, desde que permita uma comparação que eleve ligeiramente a pessoa,
como por exemplo possuir um óculos mais escuro, um topete mais firme ou um
brinco mais brilhante. Eu mesmo às vezes me pego contaminado com a moléstia da
apatia, ficando conformado com o curso das coisas. A tentação da inércia é
imensa e ubíqua... Que diabos: ânimo, meu caro! Só se vive uma vez, não faça da
vida uma série de pequenas mortes. De que adianta ter uma joia que fica
guardada na gaveta?
A falta de comunicação e de relacionamentos mais densos e ao
mesmo tempo extensos favorece esse cenário desanimador. É a partir da troca de
ideias e do confronto com visões de mundo opostas a sua que a personalidade se
enriquece. Não é cumprindo uma rotina, encerando o chão, girando em círculos,
repetindo compulsivamente uma ação qualquer, ainda que prazerosa, que
adquirimos conhecimento, civilidade ou insights. É preciso se incomodar, de
preferência diariamente; após se deleitar, dê preferência a novos desafios e
perturbações que irão fortalecer seu caráter e expandir suas experiências,
retirando o véu da ignorância e deixando-o preparado para o inusitado e o
improviso. Procedendo dessa maneira, um dia esse conjunto de atos se tornará um
hábito, então a moleza natural da decadência do corpo será compensada pela
perspicácia do espírito, o que sim faz jus à alcunha “comportamento motivador”.
Se você não tem critério para saber o que é melhor pra sua vida, você jamais
escolherá algo repleto de sentido, pois ele será útil àqueles que lhe manipularam
psicologicamente, é claro que de forma muito sutil. Autoconhecimento e senso
crítico se fazem, portanto, imperativos, contudo é algo que o sistema abomina –
afugenta fiéis.
Mergulhar a fundo é para poucos. Quem sabe é isso o que explica
esta repentina indignação. Andar pela borda da piscina olímpica é fácil,
difícil mesmo é convencer os outros a vestirem a roupa de banho e percorrem
toda a extensão e o volume da água fluorada e refrescante. Quem sabe o excesso
de informações e de contatos tenha deixado a galera superficial, pondo só uma
gota de suor em cada parte, como um investidor precavido que nunca dá all-in numa jogada apenas. Pintei
grosseiramente o cenário, quem sabe o leitor tenha me entendido e pintado o
restante do quadro com tintas mais frescas. Espero que isso tenha ocorrido e eu
tenha despertado uma ínfima parte de seu senso estético, ético e político. Afinal,
é disto que se trata este texto: receba a tela, o pincel e o esboço dos outros,
mas imprima suas cores vibrantes e seu estilo de pintar. As impressões e as consequentes
expressões devem ser únicas, apesar de essa ideia parecer tão contracorrente. Nada
mais motivador que a arte. E nada mais angustiante que o mecanicismo – err, se você
ainda não se tornou máquina...
P.S.: Texto ligeiro,
escrito em uma hora somente, talvez um recorde, para meus padrões. O tempo
urge, ando sentindo Cronos me devorar insistentemente. Aproveitei a inspiração
e a bem-vinda iniciativa, aplicando o ditado de não deixar para amanhã...
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