26 de novembro de 2009

Medo e Infância

Eu posso ter medo de algumas coisas. Mas eu seria corajoso enfrentando qualquer situação, ao menos eu projeto assim de minha cômoda contemplação. O maior empecilho seria o medo da perda, de meu status quo, que poderia ocasionar depressão. Sem dúvida, não tenho pavor de nada. Em uma provável parcial auto-análise, eu diria que meus maiores pequenos medos são de altura e de me sentir inferior (ridículo) – irônico, não?

Não sei explicar o porquê de minha insegurança em locais altos, mas eu circulo por eles, em mirantes, montanhas-russas e junto a janelas de prédios, por exemplo. Então, é algo normal, aquela apreensão de que após um movimento em falso, eu cairia e não haveria volta. Além da visão aterradora da temível queda; talvez eu precise pular de bungee jump para conhecer a sensação dessa experiência e acabar de vez com este temor.

Quanto a me sentir inferior, rejeitado, escarnecido pelo escrutínio público, com orgulho ferido e reputação manchada, é parte de minha projeção existencial. Eu preciso me achar bom e superior, à maioria pelo menos. É parte de minha personalidade, eu me esforço, quase sempre solitária e autonomamente, inflo meu ego e afago meu orgulho, no momento de expor minha vaidade, é muito difícil eu aceitar o escarnecimento, mesmo que de pusilânimes, apesar de que esses ignóbeis têm mais chances de desmoralizar, pois não entendem meu comportamento e obviamente, ao inferiorizar alguém que lhes é elevado, sentem-se exaltados. Mesmo que eu não precise da aprovação de ninguém com meus atos, é necessária minha consciência limpa, que me diga: “aí, tu é foda mermo, hein!” – e também por culpa de meu perfeccionismo.

Talvez seja essa última a minha única “angústia infantil mórbida”, resquício da vivência infantil que os psicanalistas defendem como marcos definitivos do nosso caráter. Eu sempre contestei essa posição, defendendo os traumas da adolescência como os marcos mais importantes, por justamente ser uma fase mais consciente que a da tenra infância. Conflitos edipianos e com meus pais nunca passaram pela minha cabeça, rejeito veementemente esses argumentos, se não fosse pela minha leitura sobre o tema, nem saberia que amar a mãe e querer matar o pai existisse, muito menos que fosse comum. Talvez pelo meu pai ter sido muito mais amável que minha mãe e por eu ser filho único e não ter a concorrência por atenção. Nunca fui possessivo com pessoas, apenas com objetos; sou grato a mim por hoje não ser possessivo com mais nada além de mim mesmo, apenas as minhas idéias transitórias são minha extensão.

A minha falta de religião e espiritualidade durante quase toda a minha vida, exceto por uns 2 anos juvenis, e a liberdade, ainda que restrita pela responsabilidade inevitável (como não ser um existencialista com uma criação destas?), formaram-me, como alguém não reprimido, que não precisa esconder algo por vergonha e que enfrenta qualquer inconveniente, desde que valha o risco de ferir a própria honra. O pecado não existe para mim, há apenas crime (sendo que este eu tenho contestado), porém nada de imperativo categórico, apenas hipotético, de uma forma maquiavélica. Não conheço novos conceitos psicanalíticos que invertam esta superestima da infância, por isso não argumento melhor. Porém, sei que o contexto vitoriano e repressor cristão não existe mais, o que exige a reformulação para apontar quais momentos em nossa vida são nevrálgicos à nossa idiossincrasia.

Eu tive uma infância tranqüila, é difícil eu reclamar de algo nessa fase, na verdade eu tinha pouco ímpeto, além de paixão por futebol e ser um bom aluno e filho, não me recordo de me entusiasmar com algo, talvez por algum tempo por carros e brinquedos, mas nada a que eu me agarrasse e chorasse por não ter. Por isso eu não sou um consumista hoje? Pode ser. Historinhas e músicas infantis nunca foram mágicas e tinham forte apelo. Talvez eu sempre tivesse gostado mais de agressividade, sangue, lutas e competições, mas a não prática desses atos arrefeceu os instintos psicopatas e imorais. É triste, porque não me permitiu descobrir meu dom; sempre fiz o que os outros esperassem que eu fizesse, e depois eu passei a contestar isso e a fazer só o que eu quisesse, sem ajuda, o que me deixou bastante autônomo, mas incompleto. Penso eu que é melhor ser um resistente ermitão de parcas obras e raros elogios, porém de forte individualidade, a ser marionete social, em um grupo coberto de máscaras e maquiagens, escondendo aquilo que todos temem em expor ao público, mesmo que (ilusoriamente?) feliz.

Quanto à adolescência, aconteceram situações que ainda me apresenta como fantasmas. Talvez eu superestimasse os outros; acabei não sabendo lidar com meus desejos e preceitos. O problema não foi o rompimento com a infantilidade, mas a angústia de ficar à deriva no futuro e naquele presente. Eu era invejoso do desconhecido, desconhecendo a reação? Acho que eu sempre fui diferente dos outros e, por não achar a minha “turma”, me recusei a fazer parte de qualquer uma. O que só aumentou meu orgulho, porém reduziu minhas experiências interpessoais, esfriando a compaixão que um dia eu poderia via a ter.

Tudo me levou a ser antissocial e misantropo, convivendo com a falta de exposição e experiência empática. Não sei se sofro, todavia é fato de que não tenho medo do ostracismo, afinal, se eu me dedicasse, eu seria um monge niilista ou sociopata. É isto: tenho medo de não ser temido?

Nenhum comentário:

Postar um comentário