31 de dezembro de 2009

Fanta e as lembranças

Por que a Fanta que bebemos quando criança não tem o mesmo gosto de hoje? Mudou algo em nosso paladar ou foi culpa da bebida? Por que brincar de Comandos em Ação, entre outras infantilidades, nos satisfazia e nunca mais ficaremos enfastiados do mesmo modo? Como jogar Atari ou Mega Drive que não era nosso, mesmo sem zerar, nos enchia de alegria; nada mais terapêutico...

Por que imaginar como era a técnica de tocar um instrumento era melhor que tocar um deles? A performance nunca é o que deveria ser? Por que nossa banda favorita aos 10 anos nunca mais se repetirá? Achamos graça de nosso passado, mas a nostalgia indica nossa valoração.

Por que o amor da juventude jamais se realizará? Ninguém pode ser tão belo quanto o primeiro platonismo.

Por que jogar 64 sempre terá sido mais prazeroso que a atual 51? Desejos imediatos eram satisfeitos, agora não sabemos o que queremos, apenas temos um ímpeto por algo desconhecido – consumismo agnóstico. Ah, pele lisa que nos envergonhava e que seria facilmente trocada por nossas rugas, manchas e cicatrizes...

De que adiantou meses de estudo para ser aprovado? Quem não se esforçou também passou! De que serviu meses de academia? Quem não malhou também comeu! De que serviu uma boa faculdade, com notas boas? Quem não se formou também ganhou dinheiro! De que adiantou não ter barriga? Apenas auto-estima para sonhar com uma esperança que nunca se concretizará...

Para que saber, conhecer, tocar, sentir, influenciar e ser influenciado? O que fica é sempre a primeira impressão. O subliminar e o inconsciente ativam-nos e ativam os outros. O que fazemos intencionalmente é mero alívio da consciência.

Quem não tem objetivo nunca pode comemorar as conquistas, porque não sabe o que conseguiu. Porém, uma vida calcada em tópicos é não ter individualidade, o positivismo é a destruição das surpresas que a vida nos reserva. É preciso uma cabeça de borracha para apagar os arrependimentos e gozar de uma felicidade alternativa.

Esforços não mudarão uma palha do preconceito do próximo. Julgamentos morais persistem quando se é ressentido. E quem não é? Quem não faz jogo de poder em um relacionamento? Quem se predispõe como inferior para ser submisso do dissimulado superior?

A gente nunca quer nada fácil. Mulher é mestre da jogatina do amor. Submete seus desejos em troca de sua reputação. Como ser tão estóico? Álcool para subverter...
Por que sutilezas e empatias simuladas nos amadurecem mais que vontades satisfeitas? Damos valor ao que queremos e não temos. Só quem reconhece a necessidade e sofre por sua irrealização consegue aprender. Mimados jamais serão completos.

Querer não é poder, mas é o começo. A atitude, quando não confundida com desespero, irá nos mover. Fim de ano melancólico, mas o comodismo foi repelido, só o sofrimento traz crescimento. O caminho costuma ser mais produtivo que o alvo, afinal, seria o fim, e só existe o fim quando não há mais alvo.


P.S.: 48 publicações no ano, quem conhece, sabe q esse número tem significado.

27 de dezembro de 2009

Mulheres, minhas intenções

Redenção

Atos cruéis, perversos, sensação de culpa
Não existe pecado, mas me sinto malvado
Recorro a nenhum ente, seriam desculpas

Recuso projetar falhas, ninguém se eleva
Precisa me julgar a musa que cativa
Dá-me sentido à vida e redenção, me ativa
Só consigo descobri-los numa alma de Eva

É bela, altiva, delicada e compassiva
Outro alvo, outro interesse, nada satisfaz
Entrego às damas poder, afeto e prazer
É o romântico egoísmo emancipador,
Leia ascensão mútua (não como enganador)

Desejo isso e aquela que isso lhe desejar
Mereceria mais, é somente louvar,
Devoção ociosa, apaixonado vigor,
Luxo desta época: se fazer sedutor

Quem ainda se importa apenas com a cópula –
Óbvio contemporâneo materialista –
Objetiva, coisifica-se, perde a vista

Seja tudo deixado em seu devido tempo:
Para a paixão iludir e o amor construir.
Querer hedonismo – jurar prazer sem fim
Também profundo compromisso, não ruim,
Sem posse, que liberta; um idêntico ator
Elogiar a rica performance artística
E recriar o, agora indefinido, amor


Ela em mim

Ainda penso, ainda sinto
Absorto quando ocioso
Mas tranquilo também fico
Supero o tédio se receoso

Não precisaria homenageá-la
Ela me passa segurança
Minha besta, sei que amansa
Justo por isso, nunca me cala

O vício em serotonina:
Esta será a nossa sina?
Alimentação de triptofano
Através dos atos profanos

Como esquecer seu jogo de quadril,
Os eróticos espasmos no cio?
Róseas auréolas, alva tez
Provocam genital turgidez

Sorverei, sim, sua vulva
Se em minha boca servir
O encaixe; e os cachos de uva.
Até a hora de despir e despedir

Esta relação hedonista
Desperta minha veia artista
Nenhuma substância ilícita,
Só prazer entre nós incita

Ela projeta em mim tesão
Tensão, como dizer um não?
Sonho, mesmo sem reprimir
Deixo inconsciente fluir

Proponho um brinde à juventude
Pois, implacável, o tempo urge

22 de dezembro de 2009

Sobre Relacionamento Aberto

Qual a maior prova de amor, hoje? Seria a perda da liberdade do(a) amado(a)? O sentimento de posse/propriedade se sobrepondo à efemeridade da emoção. Realismo: em um mundo vulgar e líquido, talvez seja o único valor que restou. O ciúme como insegurança e medo de ter seu objeto (sic) perdido. A fidelidade como prova moral de comprometimento. A mulher e sua quase obsessão por casamento, que a reconforta, afinal há um contrato que não a deixará desamparada; além da vaidade, reputação assegurada e a - instituição - família. Ingênuo é aquele que acredita que a mulher é mais romântica que o homem, ela sempre foi mais prática.

Sinto muito, mas, mesmo que um homem se convença da praticidade que a família traz, ou de uma metafísica em que ele sublima o amor, ele continuará desejando, conscientemente ou não, outras mulheres. Nossa culpa não é grande, são os genes que querem se perpetuar; o que somos além de máquinas gênicas? Instrumentos de melhoria do quadro social? O superego, a moral vigente, quer e espera que o macho se resigne com sua posição monogâmica. Mas as fêmeas só não são iguais porque não possuem a garantia do afeto paternal futuro. Alguns primitivos garantiam isso vivendo em comunidade, sem posse patriarcal. Todos eram de todos e cada um cuidava do outro. Porém, a estruturação social mudou.

Atualmente, o crescente individualismo impossibilita esta provisão, diminuindo a confiança de um pelo outro. Quão poderosa uma pessoa pode sentir por ser a única a receber o amor da outra? Mas e quem deseja escoar ao máximo seus amores internos potenciais, na quantidade que for necessária, para esvaziar seu recipiente de sentimentos, para tornar a enchê-lo, em um belo ciclo, que afasta ressentimentos? Dopamina, oxitocina e serotonina são viciantes. É o naturalismo contra a burocracia da vida moderna. Uma tentativa de visão artística e de potência da vida, que é mais que nosso arrogante antropocentrismo. Quem ainda vê beleza e transcendência no sexo e no relacionamento? Eles se tornaram um problema de desempenho.

Haveria mais gente feliz? Ou não há mais retorno? Tornamo-nos duros demais para coisas tão singelas? O que endurece e finca raiz é mais difícil de ornar e esculpir. A possessão e o escrutínio público não permitem esquecer nossa individuação, colocando o orgulho e a vaidade como sentimentos intransponíveis à liberdade e à ajuda de fazer feliz quem se ama. É impossível a dedicação e o carinho, em profundidade – o que mais exigir? – a quem não se tem a posse (exclusiva)? Isso é tratar uma pessoa como objeto.

Mas talvez seja também ter muitas necessidades e querer preencher os vazios, um consumismo hormonal, ou uma posse descartável, ou ainda, uma histeria por experimentação?

Quem consegue ser feliz na estabilidade e no tédio da vida a dois por tanto tempo e com tantas preocupações a solucionar? Muito pouco amoroso transferir seu problema ao outro. “Na saúde e na doença, na alegria e na tristeza”, leia-se tolerância. Isto é, continuar admirando o que é contrário aos seus valores. É preciso completude e respeito à individualidade do outro, o que é diferente. O mundo já é cheio de motivos para sermos pessimistas. O romantismo é ser cego, ignorar defeitos, quando os percebemos e nos afetam, morre toda a fantasia. Isso é ser idealista? Que pena...

Para finalizar, um trecho de uma música-tema sobre isso, A Maçã: “Amor só dura em liberdade/O ciúme é só vaidade/Sofro, mas eu vou te libertar”.

21 de dezembro de 2009

Mudarei

Cômodo repelido

Incômodo comodismo
Desconfortável conforto
O descanso é cansativo

Consolo não mais zeloso
Sossego que desanima
Negativa atividade
A gratuidade é passiva

Bem-estar desagradável
O mal-estar fortifica
Impele, motiva, afinca
Não se tem, assim se quer

O inóspito me acomoda
A proteção lhe perturba
O cuidado que enfraquece
Forças vindas do importuno:
Diligente inconformista

Desinteressante agrado
Agasalhe bem seu ânimo
Empenhe-se neste afago
À pertinente irreverência

Sofrível prazer
Alegre sofrer


Faz bem, faz mal

Pareço portador de ciclotimia,
Rainha de meu armado pedestal,
Gosto apenas do que me causa arritmia
É o caso do estouvado romance astral

É musa impassível, Hera terrível,
Vive em meio a pedras e superfícies
Nada me indica que estou a seu nível
Deste rapsodo assustam-na os artífices

Com a raridade de boas notícias
Deixo passar todas as minhas premissas
Quando recebo uma, celebro, exagero
Insensato, boto fogo como Nero

Ela me faz bem - reacende a paixão -
Ela me faz mal - escuto muito "não"

A influência da tradição Sturm und Drang
Faz abranger a falange de meu sangue
Nesta acepção simbólica da existência
É resolvido o problema da carência

Após várias derrotas e planos B,
Dúbio, pois na vaidade impera a visão,
E incauto. Retorna-me a inspiração
Só ela que renova a alegria de viver

Ela me faz bem - reacende a paixão -
Ela me faz mal - escuto muito "não"

12 de dezembro de 2009

Nada bem

Em Desarrimo

Cansado de sentir-se idiota
Cansado de ser feito de otário
Quer fugir para uma errante ilhota
E dormir sob as gotas do orvalho

É o maldito desejo que brota
Não importa mais o seu salário
Antes tivesse adquirido gota
Ou vivesse jogando baralho

Vislumbra nenhuma conquista
Pelos outros não é bem quisto
É inevitável, pelo visto,
Um futuro qualquer à vista

Não sabe enfrentar sua derrota
Por ser contumaz, não muda a rota
Aqueles que surgem em auxílio
Acalmam o ímpeto de suicídio

Veja bem, ele não faz o bem
Meu bem, ele gosta é de ninguém

Parcas vitórias premonitórias
Suas glórias fogem à memória
A busca assídua da perfeição
Verteu-se nele na depressão

Com altos deveras provisórios
Descuida, concentra-se nos baixos
E julga tudo como ilusório
Apagando jamais o seu facho

Exagero de expectativas?
Mimos impediram o atino
Fêmeas foram não receptivas
Desanima-se, em desarrimo

Tem angústia ou ansiedade
Nem, rústica é sua vaidade
Arredio, não vai mais se orgulhar
Só um arrepio, e depois se calar

Não sabe o que lhe seria melhor:
Estável, sem desafios nem riscos
Ou irritável, curto pavio e arisco.
Assim, tudo vai ficando pior

Sumiram daqui todos os dados
Assume-se, enfim, um derrotado

Exigente, e ficou intolerante,
Intransigente, e acabou emigrante
O decadente social, garante

Sua ilha precisa de brisas
Sua metafísica é tísica
Seu platônico é histriônico
Seus sonhos, ademais, insanos
Assim é o genérico inepto

8 de dezembro de 2009

Inescapável ciclo

Ciclo é mania

Cíclico impulso ciclotímico
Ciclo virtuoso tornado vicioso
Sim, com cinco ciclos sinto

Irrefletida compulsão
O retorno é sem compunção
Do pulso, sua pulsação

Como um ciclone, em espiral
A repetição sem fim, sempre igual
Repete, repele; compete, compele

Reparar é sua mania
Intensa esquizofrenia
Diz a diarista, dia a dia

De novo, ele quer revolver
Neurose impele a negação
A evitar tomar o revólver
Sucesso, enfim se mantém são
Há regresso: o ato reatado

Paranóico e maníaco compelido
Por seus traumas infantis cumulativos
Apenas megalomania egocêntrica
Ciclos retornam e repetem, intensos
Pensos ou apensos; eu penso ou não penso


Amor e Reparação

Eu gosto de você,
Bem, melhor dizendo,
Gosto deste gosto

Separo, divido, estripo
Para o meu bel-prazer
Ah! Mas que sensação.
Posso me dizer feliz...

Mas o que estou a fazer?
Am I the Jekyll and the Hyde?
Eu não sabia ser sádico
Agora vou reparar-me,
Ou seria reparar-te?

Junto tudo como um cirurgião
Sem cicatrizes para você
Eles ficaram cravadas em mim.
- Agora você me ama?

Jogo-me aos seus pés,
Subtraio-me, puno-me
Sei que devo minha vida
A quem me trouxe felicidade

Você! Que, enfim, me possui.
Agora, sim, você me ama